quarta-feira, 21 de maio de 2014

Entre o chão e o assoalho

Meu sótão de ilusões foi trancafiado. O espaço foi consumido.
Estava atolado de desilusões, caixas e mais caixas de planos sabotados.
Selos e mais selos de cartas empoeiradas, cenas resvaladas, desejos racionados.
Minhas ilusões migraram pra um porão amaldiçoado, escuro, desordenado.
Tropeço nos móveis invisíveis, nos endereços e nomes ainda lacrados.
Demoro um tempo até chegar na cadeira, sei que a máquina de escrever está ali.
Posso sentir a frieza do metal. Vou batendo letra por letra, com toda a incerteza escancarada no meu rosto envelhecido.
Posso ouvir as traças, sei que há ratos zanzando e baratas me observando. Posso sentir uma aranha fazendo sua teia ali perto.
Não me incomodo. Sou eu o incômodo no comodo deles.
Horas se vão no vão do tempo.
Decepções brotam da madeira úmida e morta.
Assim a vida é reinventada.
Estou fodido. Sou um velho fodido que aprendeu a foder pra valer.
Sei que venta lá fora, sei que chove, que faz sol.
Mas aqui, nesse calabouço, meus monstros podem dançar em paz e não há ninguém para incomodar.
Isso é liberdade.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Revira(-)volta

Bradamos segundo a segundo essa mesma monotonia
não existem dúvidas.
O reino das perguntas fora jogado fora com toda a forra, a velha iluminação e o cenário de quinta que havia pelas avenidas.
O mundo volta ao convés.
E a sorte zomba, aos nossos pés.
Hahaha.
O caminho é longo
é você quem no fim, jaz.
O caminho é caminhar,
e quanto a isso, parece que entramos em acordo, mas não há ninguém em paz.

sábado, 20 de julho de 2013

Sábado

Em São Paulo não há céu mais bonito que este, nublado.
Bem aqui, não há amor tão lindo quanto o nosso.
No meu ventre, há um rio morno, pronto a tu’alma acolher
Em São Paulo não há hora melhor que esta, e não sei qual é.
Bem aqui, ah meu bem, já não posso mais sair.
Só preciso, meu amor, estar ao teu lado pra sorrir. 

Enquanto a noite cala
O sono vem,
O tempo embala.

Enquanto o metal assovia
O descaso tempera,
O assoalho sopra.

Enquanto a sombra mostra
O sol tampa,
O infinito abre e sorve.

Enquanto o amor existe,
O maestro grita em silêncio,
A sinfonia permuta.
E o público?
Ah, o público só escuta. 

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Hipnose

o mundo está em crise.
o mundo continua uma guerra contra quem está disposto a viver.
A justiça faz  a maior injustiça já vista.
há justiça no âmbito judicial?

O mundo não está em crise.
O mundo não passa de um lar.
O mundo? ah, o mundo está acorrentado
Atordoado, sendo serenamente destroçado.

Dessa vez a população salta às ruas
De tanto ser apedrejada por estar em casa
Agora é vandalizada por tentar não ser vedada

Dessa vez a floresta foi esquecida
e a cidade esvanecida
-há palavras e bombas por toda a Avenida! -

façamos uma receita com vinagre e fogos de artifícios
Cortemos a bandeira de acordo com o degringolar do aplausível hino!
Paremos um instante e observemos o que há ali, logo adiante
-  Com muito carinho, uma criança sorrindo, há greve, estamos de férias! Viva, viva! -

Ei Ei, menino bom
Estamos progredindo,
arriscando pouco a pouco nosso infiel destino
Ore a Deus, a qual deles lhe convir e servir
não se importe tanto, as usinas foram produzidas,
foram deportadas da mídia, e continuam destruindo famílias.

Ei meu inteligente Governador,
caso queira ou não saber
Vamos tirar-lhe do poder
Porque somos o real comitê
Porque nos cansamos de perder.

Há uma mancha fétida na nossa geração.
Não se esqueça, somos frutos da antiga frustração.
Há uma esperança reprimida, espalhada pelos abismos da nação.
Há abraços e cultura, nas partes imundas, no lado esquerdo do chão.

Há uma revolta popular, tentando se libertar.

O mundo continua numa figura infinita.

O universo conspira, suspira, à deriva.

O amor fora embora, sem bagagem, sem glória.

Ainda assim,
o futuro está aqui
Disposto à nos perseguir.

Ei meu caro menino
Venha comigo, vamos fugir daqui?

quinta-feira, 6 de junho de 2013

(Quem me contou foram aqueles olhos cabisbaixos)

Existe um trilho onde o trem ainda desliza todas as manhãs
As manhãs nesse lugar se confundem com o pôr-do-sol
O trem apita ao longe
Como se quisesse que o mundo notasse a aurora desabrochar
Como se fizesse o tempo desconectar

Existe um túnel cortando as fronteiras
Um túnel gélido - conjunto de milhares de corpos -
Centenas de corações deixados, resquícios de outra guerra
Uma velha era, onde tudo era mar, onde havia um canto a se aconchegar.

Existe um trecho secreto no meio da Serra Da Mantiqueira
Uma passagem discreta, levando à alguma ilha aérea, submersa
Onde o ser humano ainda se contenta em ser humano
Onde o sangue palpita quando uma pele lentamente acaricia a outra.

Existe um trem, existe uma estrada, uma encruzilhada.
Existe um céu ensopado, anistiado, fatalmente amado.

Eia, Eia
Meu caro Senhor!
Avante, Ande!
Existe um tanque...
Distante, Constante!
Existe um rio que passa quatro vezes
Rumo ao mesmo horizonte...
Levante, Aí vem o comandante!

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Maio

O outono continua soprando aqui
forte demais, sombrio o suficiente
O outono, meu bem
Destaca minha triste tristeza
Meu eu sem rumo, na completa incerteza.


Os dias estão custando a passar
Tropeçando uns nos outros, nem os vejo acabar.
Os dias, embriagam-me
Num desespero insolúvel
Meu exagero é cáustico, meu eu suspenso em colapso.


As linhas da palma de minhas mãos
Cortam um mar policromático de destinos
Esses traços, percorrem minha pele
Desfazem e tricotam essa mania de estar sempre entre abismos.


Estamos vagando em tempos estranhos, noturnos
O tempo é uma alusão ao real, é instantâneo, irreal.
O agora ´persiste no outono, no ar, a me afagar
Estamos todos vagando, como folhas, fluindo, indo, caindo.